Fonte: Estadão
“As cidades sempre ficam esquecidas nas negociações, no entanto, são as principais fontes de gases de efeito estufa. A maior parte da população no Brasil vive nas cidades, e com o tempo tende a se agravar a demanda por energia, transporte, residência. Se falamos em reduzir as emissões de gases, não tem como não tratar como elas podem contribuir.”
O recado, às vésperas da 21.ª Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas (ONU0, em Paris, que começa no dia 30, é da engenheira Suzana Kahn. Coordenadora do Fundo Verde da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) – polo de projetos de desenvolvimento sustentável, para melhorar a mobilidade urbana e tornar mais eficiente o uso de energia e água –, Suzana é membro do IPCC (painel da ONU sobre clima) e presidente do Painel Brasileiro de Mudança Climática. Na entrevista, ela conta sobre um estudo encomendado pela Bloomberg Association, no qual analisa como ações para reduzir as emissões de carbono nas cidades podem ajudar o Brasil a aumentar suas ambições climáticas.
O estudo defende uma maior participação das cidades no processo de combate às mudanças climáticas. Por quê?
São as cidades que vão sofrer os maiores danos das mudanças climáticas. Daí a importância de elas serem as protagonistas nessa questão, mas no caso da INDC nacional (o conjunto de metas que os países apresentaram com as contribuições que podem adotar para reduzir emissões) isso ainda não tem acontecido. Ela coloca metas de emissão de carbono nos anos 2025 e 2030, mas não define quais serão os instrumentos econômicos e políticos que as viabilizarão. A estratégia adotada deve contemplar a parceria com as cidades. A população delas é mais sensível à questão, está mais próxima das medidas de prefeitos e tendem a responder melhor à política local do que as de âmbito nacional. Mas algumas políticas, no caso no Brasil, estão centralizadas no poder federal, como é o caso dos combustíveis, da geração de energia elétrica.
O que as cidades podem fazer?
Se há intenção de aumentar a participação de renováveis na matriz energética, que sejam dados instrumentos para as cidades participarem da geração de energia. Incentivar que a população tenha telhados solares, por exemplo. Isso diminui a pressão sobre a rede, por novas termoelétricas. Toda forma de geração de energia centralizada que temos no País está longe do centro consumidor, há uma enorme perda de distribuição. A produção local não tem custo das linhas de transmissão nem as perdas desse processo. Como o sistema nacional de energia é interligado, tendo uma fonte renovável no meu telhado, eu deixo de pegar energia da rede. Quando não tem sol, volta a usá-la, mas se tenho excedente de produção, posso injetar na rede. A meta de eficiência energética pode ser facilmente atingida se as edificações começarem a se ajustar a padrões eficientes de iluminação e refrigeração. Os prédios poderão ser obrigados a usar telhados brancos ou com vegetação, aumentando a refletividade da cidade. Pode se dar incentivo para que frotas municipais de veículos usem eletricidade.
Existe alguma estimativa de com quanto ações de mitigação nas cidades brasileiras contribuiriam em termos de redução nas emissões brasileiras?
Num cenário otimista, com ações nas áreas de consumo de energia, mobilidade e resíduos, é possível que as cidades brasileiras deixem de emitir até 1 bilhão de toneladas de CO2 equivalente em 2050.
Como poderia ser esse incentivo para a geração? Uma redução, por exemplo, no IPTU, para quem tem teto solar?
Sim, IPTU é um instrumento municipal poderoso. Mas a regulação também. Como é a cidade que fornece o “habite-se”, poderia estabelecer um código de obras que contemplasse medidas de baixa emissão. Materiais mais sustentáveis, arquitetura adequada, prioridade absoluta para transporte público e não motorizado, além do controle do uso do solo e exigência de manutenção de áreas verdes por parte de grandes condomínios.
Você sabia que ações de compensação ambiental contribuem para preservação do meio ambiente?
Entenda o que é neutralização de carbono.