Fazendeiros poderão recuperar matas amazônicas

Fonte: Jornal da USP

A floresta amazônica pode não ser o “pulmão do mundo”, mas é de inegável importância ecológica e econômica. Seja pelo equilíbrio climático, seja pela diversidade de seu bioma, o desmatamento da maior floresta tropical do mundo aflige autoridades e órgãos não governamentais.

Para debelar a causa mais imediata do problema, um grupo de pesquisadores brasileiros e norte-americanos trabalha no programa Getting ranchers to reforest riparian areas (“Fazendo com que fazendeiros recuperem matas ciliares”). Eles atendem a pedido do Ministério do Meio Ambiente e da Secretaria do Meio Ambiente do Estado de Rondônia.

A ideia do programa, conta Petterson Molina Vale, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto (Fearp) da USP e integrante da equipe, é incentivar proprietários de terras a reflorestar áreas ribeirinhas utilizadas na agricultura e pecuária. A medida já é prevista pelo Código Florestal Brasileiro, mas sem sucesso na motivação desses fazendeiros.

Assuntos conflitantes – soberania alimentar e preservação ambiental – estão em questão e demandam políticas públicas. Para tanto, os especialistas buscam estimativas rentáveis para os pequenos produtores rurais de gado (pecuária é a atividade que mais desmata a Amazônia) prestarem serviços ao ecossistema, restaurando as áreas ribeirinhas.

O programa leva em conta o bem-estar dos produtores rurais, já que estes devem ser remunerados por abrir mão da utilização da área de mata ciliar e reflorestá-la. E, para o cálculo desse valor a ser pago, os pesquisadores levaram em conta os gastos do produtor e o lucro de produção, o chamado “custo de oportunidade”.

De um total estimado de quase 90 mil propriedades rurais existentes no Estado de Rondônia, 200 foram alvo dos estudos. “Estimamos que a lucratividade média de um hectare de pastagem em Rondônia era de R$ 317 no ano de 2013”, diz Molina Vale.

Como esse valor varia bastante entre as diferentes propriedades, cada proprietário receberia, em média, entre R$ 3.900 e R$ 4.600 para preservar um hectare de mata ciliar ao longo de 30 anos. “Esse seria o valor médio do pagamento por serviços ecossistêmicos. Essas estimativas são ainda preliminares”, explica. Uma propriedade com 10 hectares a recuperar, exemplifica o pesquisador, deveria receber em torno de R$ 40 mil ao longo de 30 anos. O valor inclui apenas pagamento para que o produtor deixe a área se regenerar naturalmente, não prevê custos de isolamento da área nem de operacionalização do programa.

Tomando como base estes valores, estima-se que o total do programa custaria entre 1,5 e 2,5 vezes o valor total das multas aplicadas pelo Ibama no Estado de Rondônia em 2013, de R$ 146 milhões.

Serviços ecossistêmicos

Mata ciliar – vegetação que fica às margens de rios, córregos, lagos, represas e nascentes – é considerada Área de Preservação Ambiental – Foto: Marcos Santos/USP Imagens

Rondônia possui hoje um déficit de 82.180 hectares de Áreas de Preservação Ambiental (APP), 1,25 vezes maior que o município de Ribeirão Preto. Como a mata ciliar – vegetação que fica às margens de rios, córregos, lagos, represas e nascentes – pode levar uma década ou mais para se recuperar, sabe-se que o projeto em estudo só terá resultados a longo prazo.

A mata ciliar  é considerada APP, protegida pelo Código Florestal e seu desmatamento irregular é punido por lei. Essa vegetação é importante para evitar o assoreamento dos recursos hidrológicos; diminui a falta de água ao permitir que a água da chuva seja armazenada em lençóis freáticos, responsáveis pelo reabastecimento das mesmas nascentes, córregos, rios e riachos.

A aliança dos pecuaristas na recuperação dessa vegetação tem importância explicada nas grandes áreas de pastagens que invadem as matas ciliares. Assim, trabalharão ainda pelo aumento da oferta e qualidade da água, além de itens ambientais como ar limpo e presença de florestas. Mas os “serviços ecossistêmicos” trarão também benefícios econômicos, com a melhoria da saúde das pessoas e do gado que beberão água mais limpa.

Os resultados do projeto ainda são preliminares. Os pesquisadores estudam a viabilidade dos custos de produção para implementação. Os cálculos que apresentam são, por enquanto, apenas para regeneração vegetal natural.

Especialistas na recuperação amazônica afirmam que se trata de uma vegetação que se recupera muito rápido. Mas existem “alguns que defendem regeneração planejada com plantio de espécies nativas”, diz o pesquisador.

Petterson Molina Vale é cientista social ambiental e atua como pesquisador no Departamento de Economia da Fearp e no Nelson Institute for Environmental Studies, Universidade de Wisconsin, Madison, EUA.

Lívia de Oliveira Furlan, de Ribeirão Preto

Mais informações: e-mail p.m.vale@usp.br, com Petterson Molina Vale

 

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