O ambíguo saldo ambiental do Brasil

Mares de plástico

O lixo plástico nos oceanos se transformou numa campanha global liderada pelas Nações Unidas em 2018. Estima-se que, se nada for feito para reverter a tendência, haverá mais plástico do que peixes nos mares até 2050.

Ainda não se sabe exatamente de onde vem o lixo que polui o Atlântico Sul, que banha a costa do Brasil. “Boa parte do lixo que chega ao mar vem de fontes terrestres”, afirma Alexander Turra, pesquisador do Instituto Oceanográfico da USP (Universidade de São Paulo).

“Nas praias, a poluição ocorre de acordo com as atividades que são realizadas nos seus arredores”, adiciona Turra. Na região de Santos, litoral sul de São Paulo, por exemplo, cotonetes são encontrados com facilidade. “Isso se deve ao fato de a principal fonte de poluição ser o esgoto. As pessoas jogam o cotonete na privada, dão descarga, e tudo vai parar no mar”, explica.

No Brasil, o Ministério do Meio Ambiente acaba de criar uma comissão para lançar, em 2019, o Plano Nacional de Combate ao Lixo do Mar. Segundo Turra, que integra a comissão, as fontes de lixo que poluem o mar serão mapeadas como parte do Plano.

Mais ou menos verde?

No último ano, o mapa de áreas protegidas no país ganhou novos pontos. O Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, que abriga um cerrado conservado, foi ampliado. A maior extensão de caatinga preservada, região conhecida como Boqueirão da Onça, virou área protegida depois de mais de dez anos de espera. No mar, dois mosaicos de conservação foram criados.

Por outro lado, organizações apontam ofensivas que enfraquecem a Floresta Amazônica. No estado de Rondônia, 11 unidades de conservação criadas em março último tiveram uma vida curta: apenas oito dias. A Assembleia Legislativa anulou os decretos que protegeriam 537 mil hectares, o equivalente a 3,5 cidades de São Paulo. As unidades haviam recebido 657 mil reais do Programa Áreas Protegidas da Amazônia (ARPA).

“Estamos enfrentando o mais preocupante ataque ao Sistema Nacional de Unidades de Conservação dos últimos anos”, alerta Jaime Gesisky, do WWF. “O debate sobre manter ou mesmo ampliar unidades de conservação deve ser central nas políticas públicas de meio ambiente, permear todos os setores nos governos federal, estaduais e municipais. Mas essa agenda acaba sendo capturada por interesses ligados a setores produtivos, como o agronegócio e a mineração, com forte representação nos três poderes”, critica.

Situação das florestas

A redução da taxa de destruição da Mata Atlântica é um dos motivos que o Brasil tem para comemorar neste Dia Mundial do meio Ambiente. Entre 2016 e 2017, a queda foi de 56,8% em relação ao período anterior. Ainda assim, foram desmatados 125 km2, o menor valor total de desmatamento da série histórica do monitoramento, feito pela Fundação SOS Mata Atlântica e pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).

Ao mesmo tempo, outra série de observações é fonte de preocupação. “De janeiro a abril, verificamos uma taxa de desmatamento maior da Floresta Amazônica em relação ao mesmo período do ano anterior”, comenta Paulo Barreto, pesquisador. Em abril, o aumento foi de 87%. Em março, de 249%.

“Normalmente, a taxa vem de uma combinação da política e da parte econômica. Na política vemos essa instabilidade, o governo tentou muito no ano passado reduzir a proteção”, justifica Barreto. Por outro lado, o Ministério do Meio Ambiente conseguiu recuperar parte do orçamento perdido que era usado na fiscalização, adiciona Barreto.

O dado de desmatamento anual deve ser apresentado em agosto pelo INPE. Um relatório lançado recentemente pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) sobre medidas para zerar o desmatamento revelou que 20% da floresta original já foi destruída. Seriam 780 mil km2 de mata nativa perdidos – uma área mais do que duas vezes maior que a Alemanha.

Batalhas no Congresso

As atividades no Congresso no último ano provocaram polêmicas. “O pior deste último ano para o meio ambiente foi a consolidação de uma relação absolutamente indecente entre a presidência da República e a bancada ruralista”, critica Carlos Ritll, do Observatório do Clima.

A caatinga preservada do semiárido

Rittl afirma que votos de deputados foram trocados por desmonte da Funai, retirada de direitos de povos indígenas, aprovação da “lei da grilagem” (lei 13.465/17), anistia a multa e dívidas de deputados da bancada ruralista, tentativas de enfraquecimento do licenciamento ambiental e redução de áreas protegidas.

Para Márcio Astrini, do Greenpeace, o Congresso e o Palácio do Planalto representam a maior ameaça ao meio ambiente. “Como exemplo temos medidas provisórias como a que estende benefícios de até 1 trilhão de reais petroleiras, além da prorrogação do prazo do Cadastro Ambiental Rural, que são algumas das medidas que diminuem a capacidade do Estado de intervir no combate ao crime ambiental”, cita Astrini.

Uma ressalva é feita sobre a atuação do Ibama. “Por combater o crime ambiental, o Ibama teve carros queimados”, menciona Astrini a onda de violência contra a organização registrada recentemente. Segundo a instituição, foram incendiados nos últimos meses oito caminhonetes num caminhão-cegonha, uma caminhonete e a sede do Ibama em Humaitá, estado do Amazonas.

Movimento de resistência

Ainda na área ambiental, algumas decisões de governo provocaram fortes reações – inclusive de servidores. O caso mais recente é a indicação do político Caio Tavares para comandar o Instituto Chico Mendes para a Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

Segundo o corpo técnico do ICMBio, que gerencia parques, reservas, estações ecológicas e outras áreas protegidas federais do país, Tavares, de 31 anos, não teria qualquer experiência na área ambiental. A indicação gerou protestos inclusive de ex-ministros do Meio Ambiente, que escreveram uma carta ao presidente Michel Temer manifestando “extrema preocupação”.

Uma resistência da mesma natureza fez o governo voltar atrás depois de liberar a Reserva Nacional de Cobre e Associados (Renca), na Floresta Amazônica, para a exploração das mineradoras. Nesse caso, a atuação da modelo e ativista ambiental Gisele Bündchen pesou.

Propostas aguardando votação na Câmara dos Deputados e Senado Federal despertam movimentação semelhante: uma lei que libera uso de mais agrotóxicos, retirada da informação do rótulo de produtos transgênicos e liberação de cana-de-açúcar na Amazônia.

Mariana sem reparação 

A maior tragédia ambiental do país segue sem acordo final. Dois anos e meio depois do rompimento da barragem de rejeitos de Fundão, em Mariana (MG), o acordo final sobre a reparação dos danos ainda não foi fechado. Naquele 5 de novembro de 2015, 19 pessoas morreram, vilarejos, casas e memórias foram destruídos pela enxurrada.

Pela quinta vez, as empresas Samarco, Vale e BHP, donas da mineradora de onde a lama de rejeitos partiu, conseguiram estender junto à 12ª Vara da Justiça Federal em Belo Horizonte o prazo para apresentar os termos do acordo. A ação civil pública pede 155 bilhões de reais para reparação dos danos sociais, ambientais e econômicos causados pela tragédia.

Os mais de 39 milhões de metros cúbicos de resíduos de mineração que escoaram pelo rio Doce até o mar continuam no ambiente. A remoção deve ser feita sob a responsabilidade da Fundação Renova, criada para cuidar de todo o processo de reparação e restauração ambiental.

 

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